quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Awake


     Acordou.
     Seu relógio marcava 05:31 e ela procurava seu celular para desligá-lo, pois a sua 'música-despertador' (Never Young - Gogol Bordelo) ainda tocava. Levantou, acendeu a luz, pegou sua roupa e foi tomar banho. Voltou ao quarto, vestiu-se, arrumou o cabelo, comeu alguma coisa, lavou os óculos e saiu. Ao abrir o portão, notou que havia algo errado: as ruas haviam sumido, as casas haviam sumido.
     Assustada, voltou para dentro de casa. Seus pais não estavam mais lá, haviam sumido também. Não sabendo o que fazer, abriu o portão, novamente, e saiu em meio ao nada. Nada de casas, ruas, árvores, cachorros, carros. Apenas sua casa e uma imensidão branca.
     Aquela imensidão estava começando a sufocá-la, como se estivesse dentro de uma caixa apertada, porém, estava num lugar imenso. Imenso e branco.
     - Socorro!, gritava. Mas não adiantava, não havia ninguém para ouví-la.
     O desespero começou a dominá-la; seus gritos não eram ouvidos e sua voz estava ficando cada vez mais fraca. Enfraquecendo... Enfraquecendo... Até sumir por completo. 
     Seu lábio superior começou a se unir com o inferior. Boca já não tinha, a que tinha fora coberta por pele. Tentou abrir a sua boca com as mãos e num estado de desespero, começou a correr em meio àquela imensidão branca; correu tanto, tanto, que sua casa ficou para trás. Parou e tentou rasgar a pele que cobria aquilo que um dia fora boca, com as unhas, mas não obteve resultados. Sua agonia era insuportável agora. 
     Cansada, tentou sentar. Mas seus joelhos não dobravam, estavam rígidos. Tentou cair, para ficar deitada, mas não conseguia cair. Tentou chorar de desespero, mas suas lágrimas não saiam. A imensidão era totalmente branca, se andasse seria como se estivesse no mesmo lugar. Suas pernas doiam de tanto de ficar em pé, doiam mais que o normal. Sua respiração estava ficando cada vez mais rara, mas não conseguia impedir este fato e nem ao menos podia abrir a boca para tentar puxar mais ar, pois ela já não tinha boca.
     Sua respiração parou. Ela tentou puxar o ar pelas narinas, mas não havia como respirar. O vento soprava em seu rosto, mas respiração não tinha mais; quanto mais tentava puxar o ar, mais seu pulmões doiam pela falta dele. 
     Quase uma hora se passou, e ela não morria. Apenas 'desfrutava' da agonia interminável a que estava sujeita: sozinha em uma imensidão branca, porém pequena como uma caixa; com pele no lugar da boca, sem poder sentar ou deitar e sem ar. Morrer ela não morreria, mas ficaria agonizando eternamente.
     E eu apenas assistindo lá do alto...



quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Feche a porta e apague a luz


    Aquilo começava a se tornar uma idéia sedutora.
    Agora ela tinha os olhos fixos naquele objeto à sua frente e pensava: "Não deve ser tão ruim...".
     Alguém chegou em sua casa, entrou e abriu a porta do quarto onde ela estava. Ela olhou para trás e se deparou com um desconhecido encostado junto à porta.
     - A TV está ligada; dissera ele.
     Ela virou seu olhar para trás, com seu olhar vazio, e disse que tanto fazia.
     - E a luz está acesa; completou o completo desconhecido.
     Ainda olhando para ele, ela deu um sorriso, também vazio, e voltou a observar o objeto.
     A idéia era cada vez mais tentadora e não contente em apenas o observar o objeto, pegou-o em suas mãos. Aquilo estava gelado e agora a idéia era quase irresistível. O estranho, ainda parado junto à porta, perguntou:
     - Vai mesmo fazer isso?
     - Não sei, você acha que eu deveria?
     - Você já está morta mesmo.
     - Como você percebeu?
     - Dá para ver em seus olhos... Qualquer um perceberia.
     - Eu cansei de morrer todos os dias, por isso a idéia soa tão tentadora.
     - Eu sei, venho aqui todos os dias.
     - Vem?
     - Venho aqui todos os dias nos quais você morre, para desligar a tv. Você sempre esquece ligada... A propósito, ela está ligada agora. Vou lá desligá-la.
     Nisso, ele saiu e fechou a porta, branca, do quarto cinza. Ainda segurando o objeto em suas mãos, ela resolveu render-se à idéia. Colocou aquele cano frio daquela arma fria, dentro de sua boca, sentiu aquele gosto esquisito. Pensou  no que pensava basicamente todos os dias, pensou em tudo que podia e apertou o gatilho. O barulho ecoou por toda a extensão de sua casa. A porta, antes branca, agora estava vermelha.
     O estranho, antes que pudesse desligar a tv, ouviu o barulho e foi vagarosamente até o quarto. Com uma rosa branca nas mãos. Ao chegar, abriu a porta e olhou para o chão. Viu alguém, uma poça vermelha e uma arma. Jogou a rosa no poça e aquela, antes branca, tornou-se vermelha. Ele pegou a arma e colocou em cima de uma mesinha redonda feita de madeira. Deixou o quarto, deixando a porta aberta, desligou a tv e apagou a luz. Saiu pela mesma porta que entrou.
     Ao chegar do lado de fora, sentiu o vento gelado no rosto e saiu andando rumo ao nada. Com o som do tiro ecoando em sua mente. Ele parou de repente, olhou para cima e disse: "Nunca mais ela precisará morrer novamente.". Após isso seguiu seu caminho.
     Como uma alma vazia.